Justiça condena prefeitos cassados a bancar novas eleições nos municípios

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A prática de atos ilícitos no processo eleitoral ou a tentativa de burlar a legislação para garantir a candidatura já fez com que 10 políticos brasileiros tivessem de ressarcir os cofres públicos em exatos R$ 262.207,80. O valor corresponde aos gastos da União com a realização das chamadas eleições suplementares – que ocorrem quando o candidato eleito com mais de 50% dos votos tem o registro indeferido ou o mandato cassado. E a conta pode ficar ainda maior: podem entrar nos cofres outros R$ 3 milhões referentes a 84 ações já ajuizadas, a sete acordos fechados com ex-prefeitos e a outros 25 casos cujos processos estão sendo preparados pelas procuradorias da União nos estados.
A cobrança judicial dos políticos responsáveis pela realização de nova eleição tornou-se prática comum a partir de 2012, quando o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Advocacia-Geral da União (AGU) firmaram um convênio para a recuperação das verbas federais aplicadas na nova votação. Cabe ao TSE levantar as informações sobre os novos pleitos – quando necessários em razão de práticas ilícitas do eleito – para que a AGU ajuíze as ações. Para se ter uma ideia, entre 2004 e 2011, o TSE já havia gasto cerca de R$ 6 milhões com 176 eleições fora de época.

Receber o dinheiro, no entanto, não é fácil. Em primeiro lugar, a ação de ressarcimento só pode ser ajuizada depois que se encerrar o processo de cassação ou perda do registro do eleito e ficar comprovada uma conduta ilícita do envolvido. Casos em que houve apenas alguma irregularidade formal, como a falta de algum documento, por exemplo, ficam de fora das cobranças. Pelo convênio, optou-se por cobrar gastos efetuados a partir de 2004.

“Só propomos as ações quando está definida a responsabilidade do candidato sobre o fato, até para não fragilizar a nossa atuação”, explica João Bosco Teixeira, advogado da União e coordenador-geral de créditos e precatórios da Procuradoria-Geral da União. As ações são apresentadas nas varas federais, em primeira instância, e são passíveis de recursos aos tribunais regionais federais (TRFs), Superior Tribunal de Justiça (STJ) e Supremo Tribunal Federal (STF).

Sentenças condenando ao ressarcimento dos cofres da União já são várias, mas todas ainda estão em fase de recurso, o que pode levar tempo até uma decisão final. Por isso, uma opção adotada tem sido o acordo com os “devedores”. A AGU contabiliza 10 deles: sete antes mesmo de entrar com a ação e três durante a tramitação do processo judicial.

Portaria da AGU estabelecida logo depois do convênio com o TSE permite a concessão de benefícios, como desconto na dívida total. Se o pagamento for à vista, por exemplo, é concedido um abatimento de 10%. Se for feito em 10 parcelas, o desconto varia de 1% a 10%. Débitos até R$ 100 mil podem ser divididos em até 60 meses. “Há ainda outras vantagens, como deixar de responder a uma ação judicial, pagar honorários e custas processuais”, pondera João Bosco Teixeira. Sem contar que a dívida é corrigida mensalmente, pela taxa Selic. Dos R$ 262,2 mil já recebidos pela AGU, R$ 17 mil são referentes a juros e correção monetária. E ainda tem mais por vir, já que alguns débitos desses acordos ainda não foram sanados porque o devedor optou pelo pagamento parcelado, ainda não encerrado. Apenas quatro casos foram pagos à vista. Se o acordo for quebrado e alguma parcela não for quitada, o inadimplente passa a ser cobrado judicialmente, por meio de bloqueio de seus bens. No caso de ex-gestores falecidos, as dívidas ficam para os herdeiros no limite dos bens deixados.

Incentivo

Ainda não é possível contabilizar os efeitos da nova postura da União frente às eleições suplementares, mas a expectativa da AGU e da Justiça Eleitoral é que, com o passar do tempo, a penalização dos responsáveis pelo novo pleito sirva como desestímulo para os atos ilícitos. “Sabemos que essa mudança não será de uma hora para outra, mas num determinado momento vai ser mais um fator para inibir alguma conduta ilegal”, acredita o advogado da União.

E os candidatos têm um “incentivo” a mais para agir dentro da lei. É que não existe prazo legal para a cobrança da dívida com as eleições, pois trata-se de um ressarcimento por dano ao erário. A União tem um prazo máximo de cinco anos apenas para os casos de prejuízos que não tenham sido causados por um ato ilícito, como por exemplo aquele candidato que disputa um cargo amparado por uma liminar, que é derrubada depois de vencida a eleição. Os gastos dizem respeito ao deslocamento de servidores, lanche, diárias, transporte de urnas e, em alguns casos, o envio de tropas federais para garantir a segurança das eleições.

Em Minas, dívida de R$ 119 mil

Cassados por terem cometido crimes eleitorais, oito políticos mineiros estão devendo à União, no total, R$ 119.167,25 – valor que ainda será corrigido pela taxa Selic – e respondem a processos judiciais para quitar a dívida. Outros 22 ainda estão passíveis de se tornar réus em processos para ressarcir R$ 276.517,97 por um gasto que seria desnecessário, caso não tivessem cometido irregularidades que anularam a disputa em que foram eleitos.

As ações já ajuizadas envolvem os municípios de Santa Juliana, Serranos, Rio Espera, Carmo do Paranaíba, Cuparaque, Campo Florido, Cachoeira Dourada e Fronteira dos Vales. Os valores cobrados variam de R$ 7,7 mil a R$ 30,7 mil, ainda a serem corrigidos retroativamente à data de realização da eleição suplementar. Levantamento do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) indica que as principais razões para a cassação dos eleitos foram a compra de votos e o uso da máquina pública nas disputas eleitorais de 2004 e 2008 e 2012.

Em Minas Gerais, dois optaram por fazer acordos com a Advocacia-Geral da União (AGU), antes mesmo da propositura de ações, e até dezembro de 2014 já haviam pago R$ 22.643,18. São eles ex-prefeitos de Ipiaçu, no Triângulo Mineiro, que pagou R$ 10.956,47, e de Bom Jesus do Amparo, que, até fevereiro, já havia quitado 29 das 30 parcelas de um total de R$ 12.089,56.

Saiba mais

Hipóteses em que cabe ação de ressarcimento

Quando a eleição for anulada em razão da constatação de prática de ato ilícito, como abuso de poder econômico ou autoridade, uso indevido de veículos e meios de comunicação social em benefício de um candidato ou partido, compra de votos ou gastos ilegais de recursos com fins eleitorais.

Quando houver a cassação do diploma do eleito por declaração de inelegibilidade pela Justiça Eleitoral

Quando a cassação do diploma for determinada por práticas ilícitas anteriores às eleições, como a rejeição de contas ou condenação em atos de improbidade administrativa.

Você se lembra?

“Este convênio possui um significado maior, justamente o significado pedagógico: uma mensagem que nós mandamos àqueles candidatos que não queiram agir corretamente, dando causa às anulações das eleições: que tomem mais cuidado” – Ricardo Levandowski, então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em 12/1/12

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