Lobistas suspeitos de “comprar” MPs tinham elos no Planalto e em dois ministérios

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ESTADÃO: Relatório da PF lista ‘contatos’ de alvos da Operação Zelotes e
aponta ‘canal do lobby’ de montadoras para aprovação de medidas provisórias
benéficas ao setor automotivo. MATÉRIA DE :
Por Fábio Fabrini e Andreza Matais, de
Brasília, Julia Affonso e Fausto Macedo, Estadão*

Relatório da Polícia Federal diz que lobistas investigados por “comprar”
medidas provisórias, entre elas a MP 471/2009, tinham contatos no Palácio
do Planalto e ao menos dois ministérios para, supostamente, negociar
benefícios fiscais de interesse de montadoras de veículos. A análise da MP
471 passou pelos ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior, na época comandado pelo ministro Miguel Jorge; Fazenda (Guido
Mantega), Ciência e Tecnologia (Sérgio Machado Rezende), além da Casa Civil
da Presidência (Dilma Rousseff). O relatório cita como possíveis contatos
dos lobistas Erenice Guerra, secretária­-executiva da Casa Civil entre 2005
e abril de 2010; e Dyogo Henrique de Oliveira, então secretário­-adjunto da
Secretaria de Política Econômica, ligada ao Ministério da Fazenda, e hoje
secretário­-executivo do Planejamento.

Além deles, como mostrou o Estado na terça­-feira, os investigadores
mencionam o ex­-ministro Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do
ex­-presidente Lula entre 2003 e 2010 e titular da Secretaria­-Geral da
Presidência entre 2011 e 2014, na gestão Dilma; Nelson Machado,
ex­-secretário­-executivo da Fazenda; e Lytha Battiston Spíndola,
ex­-secretária­-executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex), ligada ao
Desenvolvimento. Também é citado no relatório Helder Chaves, outro servidor
que chefiou a Camex.

Na Casa Civil, de acordo com a investigação, “é certo” que os lobistas
Alexandre Paes dos Santos, o APS, e José Ricardo da Silva tinham “acesso
direto” a Erenice Guerra. “Erenice era frequentadora do escritório de José
Ricardo, nas palavras de Hugo Rodrigues Borges (ex­-funcionário de José
Ricardo), o que nos parece ser verdade, tendo em vista que os mesmos,
inclusive, possuem parceria de trabalho na defesa de interesse da empresa
Huawei do Brasil Telecomunicações junto ao Carf (Conselho Administrativo de
Recursos Fiscais)”, registra a PF.

Para a PF, outra pessoa que “possivelmente” manteve contato com os lobistas
foi “Dyogo Henrique de Oliveira”, que na época estava no Ministério da
Fazenda. Ele é citado numa agenda na qual APS registrava dados sobre a
negociação das MPs. Num dos trechos, o lobista anotou “Diogo/José Ricardo”,
seguido de “Secretaria de Política Econômica” e “SPE”.

No Ministério do Desenvolvimento, o relatório da PF indica ainda a
participação de Lytha Spíndola nas prorrogações dos incentivos de 2010 a
2015 e de 2015 a 2020 como “o canal de lobby naquele órgão”. Auditora
fiscal aposentada em 2012, ela é mãe de Vladimir Spíndola Silva, descrito
como “parceiro de empreitada” de um dos sócios da SGR Consultoria, Edison
Pereira Rodrigues. Mãe e filho são suspeitos de receber dinheiro do
esquema. Eles foram conduzidos pela PF a prestar depoimento na última
segunda­-feira. Também houve buscas nas residências e escritórios de ambos.
“Importa ressaltar a existência de pagamentos pela Marcondes e Mautoni
(empresa investigada) para as contas do escritório dos filhos de Lytha,
Vladimir e Camilo, que recebeu R$ 506.790 mil líquidos em 2010, e da
empresa de consultoria deles, a Green Century Consultoria Empresarial e
Participações, que recebeu R$ 913.301,85 entre 2011 e 2012?, sustenta o
documento.

*Chope.* A PF aponta ainda “outra pessoa que pode ter sido usada para
influenciar o processo de elaboração da medida provisória”: Helder Chaves,
servidor que chefiou a Camex em 2010. Em e­mails daquele ano, José Ricardo
diz ter colaborado para que Helder fosse nomeado para o cargo. Num deles,
os dois combinam um chope. Ele chega a trocar mensagem com o servidor em
maio daquele ano, consultando­-o sobre a possível ampliação, por meio de
“emendas parlamentares”, dos benefícios previstos na 471. “As emendas
permitiriam que novos empreendimentos pudessem, também, se beneficiar dos
incentivos. (…) Qual sua opinião técnica sobre isso?”, questiona o lobista.
Novos incentivos foram concedidos em novembro pela MP 512, após passar pelo
Desenvolvimento.

A norma também está sob suspeita de ter sido encomendada.

*“Amigo”.* O ex­-ministro Gilberto Carvalho prestou depoimento na
segunda­-feira sobre sua ligação com o empresário Mauro Marcondes Machado,
da Marcondes e Mautoni. A PF vê suposto “conluio” do ex­-ministro com o
lobista na defesa de interesses do setor automobilístico. O relatório diz
que os dois têm relação de intimidade. Em 2007, ao pedir que o então chefe
de gabinete entregasse um documento de grandes empresas ao então presidente
Lula, o lobista escreveu: “Estou recorrendo mais uma vez ao amigo para
cumprir mais uma vez esta incumbência daquela forma informal e low profile
que só você consegue fazer, sem as formalidades e no momento oportuno”.

Na agenda de APS, além de citação a Gilberto Carvalho, é mencionado “Nelson
Machado”. “Tudo indica ser o número 2 do Ministério da Fazenda”, registra a
PF.

Erenice Guerra informou que não falaria a respeito. Dyogo não atendeu a
telefonema do Estado. Ele foi procurado por meio da assessoria de imprensa
do Ministério do Planejamento, mas não respondeu. O ex­-ministro Gilberto
Carvalho nega conluio ou participação em qualquer negociata com os lobistas.

Em nota, Lytha Spíndola afirmou ter sido surpreendida com a divulgação de
graves acusações contra si. Ela sustentou que sempre exerceu cargos
públicos com “empenho e retidão” e adiantou que prestará os devidos
esclarecimentos à Justiça. “Não recebi pagamentos diretos ou indiretos e
não tive qualquer participação na edição de medidas provisórias para o
setor automotivo”, disse. Procurado, o filho de Lytha não ligou de volta.
O Estado não localizou Nelson Machado e Helder Chaves.
(foto: André Dusek/Estadão)

Lobistas suspeitos de “comprar” MPs tinham elos no Planalto e em dois ministérios

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