REQUIÃO NA VICENTE MACHADO NÃO VINGOU

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A pretensão de obter gratuitamente a área da Avenida Vicente Machado, ao do Fórum Trabalhista, para a família de Roberto Requião não está conseguindo êxito na Câmara Municipal de Curitiba. O projeto enviado pelo prefeito em exercício Paulo Salamuni, em fevereiro deste ano, encontrou resistência na Comissão de Economia e Finanças, como já tinha ocorrido em 2012 no mesmo colegiado pela então vereadora Maria Goretti (PSDB), mas com o projeto enviado pelo então alcaide Luciano Ducci.
O vereador Bruno Pessuti (PSC), conseguiu aprovar um pedido de informações em junho – sem resposta de Gustavo Fruet, a partir de um voto contrário ao relator Mauro Inacio que queria devolver a área de graça para a família Requião, massacrando:

“Em análise do Projeto 005.0023.2014 de iniciativa do Sr. Prefeito Municipal, que desafeta, incorpora aos bens dominicais e autoriza o Poder Executivo a reverter aos doadores ou sucessores de Dr. Wallace Thadeu de Mello e Silva e sua mulher Lucy Requião de Mello e Silva, a título gratuito, a área de terreno com 2,57m de frente para a Avenida Vicente Machado, desta Cidade, por 60,03m de fundos, parte do lote 25-NO-A-77 do croquis 261, necessária a abertura da Rua Prudente de Moraes, entre as Avenidas Carlos de Carvalho e Vicente Machado, havida pelo Município de Curitiba conforme Transcrição n° 28.429, do livro 3-H, do Registro de Imóveis da 1ª Circunscrição Imobiliária desta Capital.
A Comissão de Legislação e Justiça concedeu voto favorável a matéria, após a juntada do processo administrativo nº 01-025.891/2012, ressaltando as informações contidas no registro de imóveis:

“que o imóvel ora doado reverterá aos doadores ou seus sucessores no caso do donatário Município de Curitiba não levar a extensão o projeto de abertura autorizado nos termos da Lei Municipal nº 168 de 7 de abril do corrente ano”

e considerando o parecer da Procuradoria Geral do Município de Curitiba nº 150/2012, realizado pela Procuradora do Município Mariana Rocha Urban, conforme segue:

“Opina -se pelo deferimento do pedido formulado, visto que o Município não tem intenção de concretizar a extensão da via pública mencionada na Lei Municipal 168/1646.”

e em acordo a aprovação da Consultora Jurídica, Drª. Chris de Almeida Guimarães da Costa, da Procuradoria Geral do Município de Curitiba, no qual destaca:

“No tocante à prescrição apontada pela informação desta PGCJ (fls 45-47) entendo que a mesma não ocorreu, uma vez que autorizativa da doação não estipulou prazo para a abertura da rua, tampouco houve qualquer questionamento anterior acerca do descumprimento da condição. Deste modo entendo que o prazo prescricional começa a fluir somente a partir deste requerimento.”

Entretanto, é importante conferir que entre a data de doação em 1949 e o efetivo protocolo do requerimento em 2012 se passaram mais de 60 anos.

Através de consulta ao setor de IPTU do município, deve-se registrar que a Prefeitura de Curitiba autorizou a construção de um edifício com 12 pavimentos e 7.779,40 m² no lote com indicação fiscal nº. 11-119-062.000-8 no ano de 1982, ou seja há 32 anos. Esse lote se localiza exatamente ao lado do lote objeto do presente Projeto de Lei, que visa a reversão da doação aos sucessores do antigo proprietário.

Cabe ressaltar que sobre o lote de indicação fiscal nº. 11-119-062.000-8 também estaria previsto a abertura da Rua Prudente de Moraes, que motivou a doação do terreno em 1949. É possível verificar, às fs. 43 do processo, que o lote com indicação fiscal nº 11-119-030.000-6 fica exatamente ao lado do lote em que houve a liberação de construção em 1982.

A simples autorização de construção com alvará e demais documentos expedidos no ano de 1982 são uma prova inequívoca de que a Prefeitura Municipal não tinha mais interesse em promover a abertura da Rua Prudente de Moraes.

Da mesma forma, às fls. 15, o IPPUC informa que o lote de indicação fiscal nº 11-119-055.000 também seria afetado pela abertura da Rua (Alameda) Prudente de Moraes. No mesmo lote, foi construído um edifício com 4 pavimentos em 1971, que passou a ser tributado a partir de 1998.

Logo, não é razoável alegar que o prazo prescricional começou a contar com uma manifestação documental da Prefeitura no ano de 2012, visto que se mostra clarividente que a própria Prefeitura não tinha mais interesse na abertura da rua há mais de 30 anos.

Se considerarmos o prazo prescricional da data da doação em 1949, pelo Código Civil de 1916 esse prazo seria de 20 anos.

Nota-se que já se passaram 32 anos desde a manifestação de desinteresse de abertura de rua pela Prefeitura, através da autorização de construção de edifício em lote também atingido pela afetação.

Segundo a doutrina brasileira que trata sobre o Direito Civil existem diversas classificações para o instituto da doação, porém, a doação tratada na Escritura de Doação, que se pretende reverter em favor dos doadores ou sucessores de Dr. Wallace Thadeu de Mello e Silva e sua mulher Lucy Requião de Mello e Silva, é a da espécie “doação com encargo, onerosa ou gravada”, onde se estabeleceu como encargo, que o bem fosse utilizado para fins de extensão do projeto de abertura da Rua Prudente de Moraes, conforme prevê o art. 553 do Código Civil Brasileiro (art. 1.180 do Código Civil de 1.916):

Art. 553. O donatário é obrigado a cumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral.

Na hipótese de não cumprimento do encargo, devem os interessados promover a notificação do donatário para satisfação da obrigação, sob pena de execução, conforme prevê o art. 562 do CCB (art. 1181, parágrafo único do Código Civil de 1.916):

Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário, assinando-lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida.

Segundo o autor Ricardo Fiuza:

A constituição em mora do donatário se faz pelo vencimento do prazo. Não o havendo, para o cumprimento, obriga-se o doador a notificar judicialmente o donatário, assinando-lhe, então, prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida (RT, 204/252).(FIUZA, Ricardo (Coord.). Novo código civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 490)

A discussão permeada no Projeto de Lei se fundou no início da contagem do prazo prescricional para requerer a reversão da doação, todavia, seria inconcebível e atentatório contra a própria segurança jurídica, que transcorridos mais de 60 anos da lavratura da Escritura de Doação, se considerasse como termo a quo para contagem do prazo prescricional, a data do requerimento que deu origem ao presente Projeto de Lei.

Neste sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

“CIVIL. PRESCRIÇÃO. A ação para tornar sem efeito a doação por motivo de inexecução do encargo prescreve em vinte anos. Recurso especial não conhecido” (REsp 472.733/DF, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/02/2007, DJ 16/04/2007 p. 181)

“RECURSO ESPECIAL. DOAÇÃO DE TERRENO PÚBLICO. REVOGAÇÃO. INEXECUÇÃO DE ENCARGO. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. ART. 177 DO CÓDIGO CIVIL/16. PRECEDENTES. 1. O prazo prescricional para revogação de doação de terreno público por inexecução de encargo é de vinte anos, nos termos do art. 177 do Código Civil de 1916. 2. O art. 178, § 6º, I, do Código Civil de 1916 aplica-se apenas às hipóteses de revogação de doação por ingratidão do donatário. Precedentes. 3. Recurso especial provido” (REsp 231.945/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/08/2006, DJ 18/08/2006 p. 357).

Não há como se considerar eventual falta de constituição em mora, uma vez que o art. 219 do Código Civil vigente é claro ao dispor que “A citação válida (…) constitui em mora o devedor e interrompe a prescrição”, e o art. 297, parágrafo único, da mesma lei, preconiza que “não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial”.

Em última análise, o fato de, passados mais de 60 anos da data da doação do bem público, não ter sido cumprido o encargo, a despeito da ausência de prazo determinado, bem como considerar a data de apresentação do requerimento como início do marco prescricional afronta o princípio da razoabilidade.

Sobre o assunto, discorre Arnaldo Marmitt:

“A rigor inexiste prazo ilimitado ou perpétuo. Qualquer ilimitação temporal pressupõe a prestação material da obrigação em tempo oportuno. Inconcebível estipulação de prazo infinito para a obrigação, ou de prazo eterno, o que não levaria a nada ou ao absurdo. Sempre há o direito do doador a preservar. O próprio bom senso recomenda repudiar inexistente o prazo ilimitado. Inexistindo ele, os atos entre vivos são exeqüíveis desde logo, salvo se a execução depender de tempo (…)” (in Doação, Editora Aide, Rio de Janeiro, 1994).

Nesse sentido:

“Desnecessidade de notificação prévia para constituição em mora, pois transcorridos quase vinte anos da data da doação, prazo mais do que razoável para o cumprimento do encargo.
Ademais, a citação válida já constitui o devedor em mora” (Apelação e Reexame Necessário Nº 70008775173, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Francisco Pellegrini, Julgado em 15/03/2005).

Sendo assim, sugere -se que a reversão da área aos sucessores seja passível de mérito, porém a título oneroso, visto que foi vencido o prazo prescricional para que os mesmos tivessem o direito de reversão gratuita.

Por fim, entende-se necessário que as informações tributárias, referentes ao lote 11-119-030.000-6, visto que o mesmo encontra-se com solicitação de indicação à Dívida Ativa, por falta de pagamento de IPTU. Essa informação é importante, para que seja possível verificar se os atuais proprietários fizeram os pagamentos de impostos sobre a área afetada pelo Projeto de Lei, o que poderia lhes resguardar ou não o direito de posse da mesma.

Concluindo, o Parecer é pela solicitação de mais informações ao Autor, conforme relato.”

Votaram com Bruno Pessuti: Paulo Rink, Aladim Luciano, Tito Zeglin e Serginho do Posto. Derrotado – o antigo relator Mauro Inácio.

Ofício de Paulo Salamuni, à época o autor do Projeto de Lei para o prefeito Gustavo Fruet.

PALÁCIO RIO BRANCO, 24 de junho de 2014.

Ofício Nº 692/2014-DAP/DCT

Senhor Prefeito:

Atendendo solicitação contida no Parecer nº 034/2014, exarado pela Comissão de Economia, Finanças e Fiscalização, encaminhamos a Vossa Excelência, cópia do Projeto de Lei Ordinária nº 005.00023.2014, que “Desafeta e incorpora área de domínio público aos bens dominicais e autoriza o Poder Executivo a reverter aos proprietários anteriores o imóvel que especifica”, para obtenção de informações, conforme justifica.

Atenciosamente,

Vereador PAULO SALAMUNI

Presidente

Excelentíssimo Senhor

GUSTAVO BONATO FRUET
Prefeito Municipal de Curitiba
Nesta Capital

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