Veja mostra uso político do
MST na invasão da Araupel
Desde de 16 de julho, 500 sem-terra armados com foices e facões invadiram a fazenda da Araupel, em Quedas do Iguaçu, no sudoeste do Paraná. A revista Veja esteve lá e mostra que a invasão ganhou caráter político-eleitoreiro com o apoio e financiamento que recebe do governo federal. A invasão, patrocinada pelo PT e com apoio e incentivo do senador Roberto Requião (PMDB), mostra famílias de outros estados, como São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais, e um invasor com características peculiares, possuem carros, caminhonetes e usam roupas e calçados de grife.
A revista aponta o apoio que recebe de integrantes do PT no governo federal, como o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral) e o deputado Dr. Rosinha (PT), coordenador do comitê da campanha Dilmão (Dilma+Requião), que usou suas emendas parlamentares para financiar os assentamentos, patrocinando indiretamente as ações e invasões do MST. No total, os assentamentos do MST receberam a soma de R$ 300 milhões nos últimos 10 anos, e só em Quedas do Iguaçu foram destinados R$ 36 milhões em emendas.
O MST já conseguiu com invasões anteriores o controle de cerca de 60% da fazenda original que pertence à Araupel, criando o maior assentamento da América Latina, mas os dirigentes querem mais. “O pessoal não vai sair, porque nós estamos discutindo um novo jeito de produzir no campo. Estamos retomando as grandes invasões” diz o líder da invasão Danilo Ferreira, o “Cabeludo”. Com a nova invasão à área de cerca 33 mil hectares, a empresa que gera mais de 2 mil empregos diretos na cidade e injeta R$ 50 milhões na economia local, e pode deixar o Paraná por conta da insegurança jurídica. Confira a reportagem na íntegra.
Cidade Sitiada
Com o apoio de um grupo ligado ao PT, o MST resolve retomar a invasão de fazendas produtivas. No Paraná, uma indústria pode até encerrar as atividades
Robson Bonin, de Quedas do Iguaçu (PR)
As roupas, os carros e as caminhonetes estacionados ao lado das barracas construídas com toras de madeira revelam que o perfil dos militantes do MST que invadiram há duas semanas as terras de uma indústria de reflorestamento no interior do Paraná mudou radicalmente nos últimos anos. É a nova geração de invasores, que usa tênis de marca, tem celular, motos e caminhões para ajudar no trabalho pesado. Cobertos por lonas novas, mais resistentes do que no passado, os barracos são espaçosos e estão fartamente abastecidos de suprimentos enviados pelas cooperativas ligadas ao movimento. O semblante desenganado dos desafortunados deu lugar a um ar confiante e a um discurso mais arrumado sobre o que eles entendem por reforma agraria. A maioria tem endereço fixo e a lona é nada mais que um ritual de passagem. A ocupação é o atalho pelo qual muitos filhos de assentados esperam deixar a casa dos pais para construir o patrimônio. Antes inimigos declarados do Estado, que não lhes provia condições dignas de vida no campo, os jovens sem terra agora posam política de Brasília. Só uma coisa não mudou: a tática e os métodos criminosos para se apossar de propriedades alheias.
Quedas do Iguaçu é um município de 33 000 habitantes a 447 quilômetros de Curitiba que estrutura sua economia na agricultura, na pecuária e no setor de beneficiamento de madeira, em que se destaca a Araupel, uma das maiores indústrias de reflorestamento da região. A empresa emprega um quarto da força de trabalho da cidade. Além de gerar 2000 empregos diretos e indiretos, sustenta toda uma rede de fornecedores que injeta na economia 50 milhões de reais por ano em salários e investimentos, valor equivalente ao próprio orçamento municipal. É a espinha dorsal econômica da cidade. É, também, o alvo principal do MST. Há duas semanas, 500 sem-terra armados com foices e facões ocuparam um novo pedaço da fazenda da Araupel – que já foi uma das grandes proprietárias de terra da região, com 85000 hectares de florestas cultivadas no estado.
Nas últimas duas décadas, o MST promoveu quatro invasões nas áreas da indústria e conseguiu a desapropriação de 52000 hectares, criando ao maior assentamento da América Latina – mas, segundo os líderes do movimento, ainda insuficiente. Uma vez assentados, os sem-terra criam filhos para ser os invasores do amanhã. Desse modo, não importa quantas famílias o governo ampare, sempre haverá novos sem-terra e mais invasões. Lutando na Justiça para reaver a área, a empresa questiona os reais interesses dos intrusos. “Eles não invadem ao acaso. Escolhem sempre o nosso espaço mais lucrativo, com árvores maduras para o corte. Só a madeira que está nessa área que eles ocuparam vale 100 milhões de reais”, diz o diretor da Araupel Tarso Giacomet.
O coordenador do MST no Paraná, Danilo Ferreira, conhecido como cabeludo, que lidera essa nova geração de sem-terra, é um exemplo de como a invasão se retroalimenta. Filho de assentado, ele também conseguiu seu lote de terra invadindo a área de reflorestamento da empresa e, agora, está na linha de frente da nova ocupação. Dono de um supermercado que vende produtos aos assentados, ele não esconde o desejo: estrangular a empresa “porque ela exporta para os Estados Unidos”. “A sobrevivência da Araupel realmente está em risco”, afirma Giacomet. A empresa já conseguiu na Justiça a reintegração de posse, mas os sem-terra se recusam a deixar o local – e ameaçam partir para o confronto.
Às vésperas de uma eleição, o problema deixa de ser policial e ganha contornos políticos. De um lado, o governo do estado, comandado pelo PSDB, quer evitar usar a força por temer que a reintegração de posse venha a produzir um confronto violento com os invasores. Para não provocar estragos na campanha de Beto Richa, os mediadores tentam retirar pacificamente as famílias da área. Do lado do MST, no entanto, está a turma que deseja ver o “bicho pegar”. Cientes das implicações políticas favoráveis ao movimento em plena campanha eleitoral, os sem-terra protegem-se no apoio que recebem de integrantes do PT instalados no governo federal, como o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e o deputado Dr. Rosinha, que usa o dinheiro das emendas parlamentares para tirar proveito do potencial eleitoral dos assentamentos.
Nos últimos dez anos, os repasses feitos a um conjunto de instituições reconhecidamente controladas pelos sem-terra no país somaram 300 milhões de reais. Já nos assentamentos da região de Quedas do Iguaçu, apenas duas dessas associações receberam 36 milhões de reais. Com os cofres cheios o MST envolveu a cidade em uma atmosfera de medo. As autoridades locais evitam criticar os sem-terra porque temem ser alvo de retaliação. Em julho do ano passado, um grupo de 250 sem-terra assumiu o controle do município por um dia inteiro. Descontentes com a qualidade das estradas do assentamento, eles chegaram armados e ocuparam a prefeitura. Depois de expulsar os funcionários, o grupo vandalizou a sede do Executivo. Meses antes, os sem-terra recorreram ao mesmo expediente para fechar a agência do Banco do Brasil na cidade e, com isso, forçar a renegociação de dívidas. A população foi impedida de recorrer ao banco por quase uma semana.
Com a nova ocupação nas terras da Araupel, o cinturão de invasões deixa Quedas do Iguaçu cada vez mais sitiada pelos sem-terra. Segundo o presidente da associação comercial da cidade, Reni Felipe, as incertezas sobre empregos da Araupel derrubaram 60% das vendas no comércio e provocaram a desvalorização de boa parte dos imóveis na região. A presença do MST também inflou a população, mas não trouxe benefícios econômicos porque muitas famílias vivem exclusivamente da renda de programas sociais, como o Bolsa Família. Sob a condição do anonimato, a dona de um dos principais restaurantes de Quedas diz que o movimento recrutou moradores da própria cidade, interessados em um pedaço de terra fácil. “Meu garçom, que ganhava 1100 reais aqui, pediu a conta e está lá acampado agora. Como o governo dá de tudo para essa gente, por que trabalhar, né”, ironiza ela.