A Itaipu Binacional, cujo capital no Brasil é da Eletrobras, contratou o
escritório do advogado Tiago Cedraz por R$ 1,58 milhão para atuar em
processos em diferentes Cortes, entre elas o Tribunal de Contas da União
(TCU), presidido pelo pai de Tiago, Aroldo Cedraz. O contrato com o
escritório foi assinado em outubro de 2013 e tem vigência até agosto de
2016, com previsão de honorários mensais de R$ 46 mil. As informações são
d’O Globo.
Itaipu, depois de uma análise de quase dez anos do TCU, entrou no escopo de
fiscalizações do órgão, o que pode começar a ser feito ainda neste ano, o
que levaria a uma atuação direta do escritório Cedraz Advogados. Aroldo
atuou em processos que analisaram a necessidade da estatal ser fiscalizada
pelo órgão de controle.
O filho do presidente do TCU foi alvo de mandado de busca e apreensão
deferido pelo Supremo Tribunal Federal (STF), dentro da Operação Politeia,
que recolheu provas e apreendeu bens de autoridades e outros investigados
na Operação Lava-Jato, entre eles os senadores Fernando Collor (PTB-AL),
Ciro Nogueira (PP-PI) e Fernando Bezerra (PSB-PE). No caso de Tiago, a
Polícia Federal (PF) recolheu no último dia 14 documentos em seu escritório
de advocacia e em seu apartamento em Brasília.
O dono da construtora UTC, Ricardo Pessoa, acusou o advogado de venda de
informação privilegiada do TCU. Pessoa afirmou, em delação premiada, ter
feito pagamentos mensais de R$ 50 mil ao filho do ministro, mais um repasse
de R$ 1 milhão para ver atendidos os interesses da UTC num processo sobre
um contrato da empreiteira nas obras da usina nuclear Angra 3.
O Cedraz Advogados tem uma vasta carteira de clientes interessados na
desenvoltura de Tiago no TCU, a maioria deles empresários e associações
acusados de mau uso do dinheiro público. A lista inclui órgãos públicos,
como é o caso de Itaipu Binacional. A usina é controlada por Brasil e
Paraguai. Em outubro de 2013, recorreu ao escritório e assinou o contrato
de quase três anos.
No escopo do contrato está a prestação de serviços jurídicos especializados
em causas que Itaipu seja ou possa vir a ser parte. A previsão inclui,
portanto, a perspectiva de fiscalização das contas da estatal pelo TCU,
como ficou aprovado em plenário em dois julgamentos neste ano. Além do TCU,
a contratação prevê atuação no STF, no Superior Tribunal de Justiça (STJ),
nos Tribunais Regionais Federais (TRFs) da 1ª e da 4ª Regiões e na Justiça
Federal do DF.
Reportagem publicada pelo jornal “Valor Econômico” nesta quinta-feira
mostrou a atuação do escritório de Tiago num processo que tramita no STF,
em defesa de Itaipu. A ação pode derrubar a determinação do TCU para que a
estatal seja fiscalizada, segundo a reportagem. O Supremo decidirá se a
usina deve se submeter à Lei de Licitações, o que implicaria a necessidade
de a empresa ser fiscalizada.
O primeiro processo aberto no TCU para tratar da necessidade de Itaipu ser
fiscalizada pelo órgão de controle é de 2006. Três anos depois, numa
decisão em plenário, o procedimento foi convertido numa diligência e o
Ministério das Relações Exteriores foi chamado a ingressar nos autos. O
relator foi o ministro Raimundo Carreiro. Aroldo Cedraz votou no processo.
Em 2011, novos processos foram instaurados para discutir se a estatal
deveria ser fiscalizada, também relatados por Carreiro. O plenário decidiu
em janeiro deste ano que Itaipu deve ser fiscalizada. Os ministros deram
prazo de 90 dias para um levantamento sobre as contas da empresa, com
análise da composição da tarifa de repasse de energia da usina e dos gastos
da União envolvidos. Aroldo não estava presente nessa sessão.
A Eletrobras recorreu, mas, em abril, o plenário confirmou a decisão e
estabeleceu a contagem dos 90 dias a partir do trânsito em julgado – quando
não haverá mais possibilidade de recursos – para o início da auditoria.
Aroldo presidiu essa sessão, mas não votou, pois não houve necessidade de
desempate.
Carreiro também foi o relator do processo relacionado à usina Angra 3 em
que a UTC acabou saindo vitoriosa. O ministro decidiu dar continuidade a
uma licitação em que a empreiteira, integrante de um consórcio, já estava
pré-selecionada. O grupo foi o vitorioso da concorrência e assinou contrato
de R$ 2 bilhões.
Por meio da assessoria de imprensa, a usina Itaipu Binacional afirmou que o
escritório de Tiago não atuou nos processos do TCU que decidiram pela
necessidade de fiscalização. “Embora faça parte do escopo do contrato, a
Cedraz Advogados nunca representou judicialmente a Itaipu Binacional em
qualquer processo junto ao TCU”, cita a resposta da empresa à reportagem.
A estatal admite interromper o contrato se ficar comprovada a participação
do advogado num dos esquemas investigados pela PF. “Itaipu Binacional
acompanha atentamente a questão e reserva-se ao direito de adotar, a
qualquer momento, as medidas que entender necessárias à preservação de seus
interesses.”
A usina já patrocinou com R$ 235 mil um evento do TCU realizado em março
deste ano, capitaneado pelo presidente Aroldo Cedraz, sobre “Governança dos
Solos”. Itaipu diz que o pedido de patrocínio foi feito em julho de 2014 –
antes da posse de Cedraz na presidência, em dezembro de 2014 — e que não se
“vislumbrou qualquer conflito”. “A contratação do escritório Cedraz
Advogados foi anterior ao evento”, diz a assessoria de imprensa.
O ministro Aroldo Cedraz sustenta que não atua nos processos do filho e dos
sócios do Cedraz Advogados, com declaração de impedimento. Carreiro nega
qualquer irregularidade e diz não ter sido beneficiário de qualquer
vantagem ilegal.
Tiago diz manter a decisão de não atuar pessoalmente no TCU. “O aumento do
número de processos acompanha o crescimento gradual e orgânico do
escritório. As decisões do escritório acerca da alocação de profissionais
nos casos patrocinados obedecem tão somente a critérios de expertise dos
advogados envolvidos”, disse a assessoria do escritório numa das notas
divulgadas desde a operação da PF.